Pastor leigo ou teólogo? Qual o melhor?

02/12/2015 16:18

Por: Ricardo Moreira Braz do Nascimento

A vida é um grande aprendizado. Dia após dia amadurecemos e aprendemos sobre muitas coisas. Mark Twain disse que "a vida seria infinitamente mais feliz se pudéssemos nascer aos 80 anos e gradualmente chegar aos 18.” Seu pensamento é que se nascêssemos com a maturidade de 80 anos, aos 18 seríamos a perfeita combinação entre maturidade e vigor físico. Esta corrida em busca da maturidade nos acompanha diariamente, enquanto esperamos que as vicissitudes da vida nos tragam maturidade. Como destacado na peça Hamlet, quando o bobo diz ao rei Lear: “Não devias ter ficado velho antes de teres ficado sábio”. Shakespeare entendia que o pior mal que pode acontecer a um homem é envelhecer sem sabedoria.

O ministério pastoral exige muita sabedoria e a prerrogativa é que o pastor seja sábio, sua missão é cuidar da igreja, seu papel (porem não somente dele) é pregar o evangelho a todos. Na bíblia encontramos instruções claras sobre a sabedoria no ministério, por exemplo em Malaquias 2:7 diz “Porque os lábios do sacerdote devem guardar o conhecimento, e da sua boca todos esperam a instrução na lei, porque ele é o mensageiro do Senhor dos Exércitos.”

Então o pastor está diante de um desafio, a saber, ser a voz de sabedoria que a igreja precisa. Deus é perfeito, Jesus é o verdadeiro pastor e a Bíblia é completa. Mas o pastor, aquele que tem a missão de ensinar, possui erros e limitações. Nestas condições temos que reconhecer e admirar aquele que se dedica ao estudo da Palavra de Deus, aquele que busca qualificação para esta importante tarefa. Quem se matricula em um bom seminário ou até mesmo num curso de graduação em teologia faz muito bem. Outros por dificuldades diversas não conseguem se tornar acadêmicos em teologia, mas estudam a através de bíblias de estudo, dicionários bíblicos e muitas outras ferramentas. Estas horas em dedicação aos estudos são importantes, pois este conhecimento colabora com a maturidade do pastor e consequentemente da igreja. Ao mesmo tempo evita que o pastor seja conduzido a algum tipo de falso ensino da bíblia.

No entanto temos que considerar que muitos pastores são leigos e isto não é um problema no ministério pastoral, eu mesmo conheço muitos pastores leigos que são referência de apascentamento e aconselhamento. Mas este caminho é perigoso, pois o pastor leigo pode ser mais facilmente conduzido a algum falso ensino ou errado entendimento das escrituras, no entanto não é difícil encontrar doutores teólogos que se perderam em falsos ensinos.

Este cenário é palco de grandes debates, os pastores leigos criticam os teólogos afirmando que a teologia é ciência de homens e importa é o que o Espírito Santo fala e não os livros. Quem diz isto deve lembrar que a Bíblia foi inspirada pelo Espírito Santo, portanto estudar e entender a bíblia é entender o que o Espírito Santo ensina através das escrituras. E mesmo os pastores leigos utilizam estudos e argumentos de teólogos, por exemplo, o ato de ministrar a Santa Ceia mensalmente começou na igreja de Genebra na época do grande reformador João Calvino.  É um paradoxo desprezar a teologia e seguir a orientação de um grupo de teólogos quanto à periodicidade da santa ceia.

Seminaristas ou aqueles formados em seminários adquirem bom conhecimento bíblico e aprendem muito sobre a rotina pastoral. Em seus anos de seminários (muitas vezes em tempo integral) aprendem e se esforçam para executar suas atividades pastorais com excelência, mesmo assim eles sofrem acusação dos pastores leigos e teólogos. Os principais argumentos pelos leigos são de que nem Jesus, nem os apóstolos estudaram em seminário. Por outro lado também é dito que morar em seminário não forma um pastor, mas sim o chamado de Deus. Já teólogos graduados questionam a profundidade do conhecimento do seminarista, afirmando que os seminários ensinam apenas a doutrina da sua própria igreja, então a educação se torna deficiente e superficial. Eu mesmo já ouvi que o seminário é um curso válido apenas para a denominação e não é um bacharel científico.

Estes críticos esquecem que a formação de pastores em seminários é uma ótima ferramenta para testar o chamado pastoral, porque se alguém tem problemas de relacionamento interpessoal ou é indisciplinado quanto à leitura bíblica e rotinas de oração, certamente não será um bom pastor, então o seminário se torna uma ferramenta de seleção.

O estudo bíblico informal (sem seminários ou faculdades) já representou uma grande mudança no cenário religioso e grandes homens da história participaram. Por exemplo, com apenas 26 anos, em 1769 na Inglaterra, a jovem Hannah Ball Moore, criou a primeira Escola Dominical em sua casa. Seu objetivo era a evangelização de crianças no domingo de manhã. Uma década mais tarde em 1780, o metodista Robert Raikes agrupava crianças e adolescentes na rua todos os domingos e das 13:00 as 17:00hs estas crianças eram levadas a igreja para estudar a bíblia. Esta é a origem da Escola Bíblica Dominical (EBD) conhecida por todos nós. Como vimos o estudo informal também possui seu valor e importância. Quanto à profundidade do estudo não pode ser culpa do seminário ou faculdade, cabe ao aluno se dedicar aos estudos e não se deter ao assunto que prefere ou que foi citado durante as aulas. Se eu me limitasse ao que aprendi em sala de aula, hoje, meu conhecimento seria bem menor do que tenho hoje.

Teólogos graduados em faculdades, muitas vezes com mestrado e doutorado, são orgulhosos dos títulos que possuem, assim como da sua capacidade de dissertação e de compreender amplamente diversos assuntos religiosos. Certamente este trabalho é importante, pois muitas heresias surgem sutilmente dentro da igreja e muitas vezes camufladas de estratégia ou nova visão de Deus. Então uma ampla reflexão sobre o tema somada a acurada avaliação do texto bíblico determinará se tal estudo está correto ou não, conduzindo assim a igreja de volta ao caminho das escrituras. Todos devem conhecer igrejas que sempre mudam de estratégia ou mesmo sua teologia. Para justificar estas mudanças o pastor (ou bispo \ apóstolo) argumenta que esta é uma “visão de Deus”, mas se esta “visão” muda sempre, então posso dizer que Deus está sempre mudando de ideia?

Os pastores leigos e os seminaristas acusam os teólogos graduados de serem superficiais, sem intimidade com Deus. Argumentam também que tanto estudo os afastou de Deus, de modo que não há lucro algum no estudo porque o preço do título acadêmico foi a perca da fé. Não posso negar que muitos teólogos já perderam sua fé em Deus e foram autores de grandes heresias. No entanto perder a fé não é privilégio dos mestres e doutores, em todos os graus acadêmicos e até no analfabetismo encontramos pessoas que perderam a fé. Logo a ausência de fé não é resultado do estudo teológico. Se fosse assim, até mesmo os pastores leigos, se afastariam de Deus na mesma medida em que ampliam seu conhecimento bíblico.

Teólogos criticam os seminaristas dizendo que o curso de seminário é insuficiente, ao mesmo tempo consideram que os pastores leigos não são qualificados para a função. Estas afirmações sobre os seminários são preconceituosas, pois existem seminários de altíssimo nível como o Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper que é uma referência nacional em ensino teológico, além do mais o quanto cada aluno se qualifica não depende da instituição e sim do esforço de cada um, com certeza existem alunos de graduação em teologia com bem menos conhecimento que muitos alunos de seminário. Afirmar que pastores leigos são desqualificados por não possuírem curso regular de teologia é outra inverdade, pois o ministério pastoral exige muito mais do que conhecimento acadêmico; a tarefa de apascentar, aconselhar, ser paciente e acima de tudo amar a obra de Deus não é aprendida em livros, palestras ou teses. Isto é resultado do chamado que Deus deu a cada pastor.

Debater a relevância destes argumentos me parece mais um duelo de egos do que preocupação com a obra de Deus. Ser leigo, seminarista ou um especialista em teologia é uma decisão de cada um, que a partir daí desenvolve seu trabalho conforme acredita que foi chamado por Deus. Na carta aos Romanos, Paulo nos diz que “Se o seu dom é servir, sirva; se é ensinar, ensine; se é dar ânimo, que assim faça; se é contribuir, que contribua generosamente; se é exercer liderança, que a exerça com zelo; se é mostrar misericórdia, que o faça com alegria. (Romanos 12:7,8)”. Todos possuem pontos positivos e negativos e ninguém é bom o suficiente para criticar outro e tentar se colocar acima. Precisamos lembrar que cada um serve a Deus dentro das suas qualificações e condições. Em todas as criticas levantadas aqui, não foi considerado a relevância da sinceridade ao fazer a obra de Deus. É importante saber se cada um faz a obra com sinceridade no coração, com a intenção de servir a Jesus Cristo com melhor de suas possiblidades. Não estou convidando a se esquecer das qualificações e pensar apenas na intenção do coração, fazendo do sentimento um juiz e mestre em questões de fé, mas quero lembrar que apenas Deus é o justo juiz. Se cada um faz a obra de Deus com sinceridade e possui a intenção de agradar a Deus e não a si mesmo, já temos um bom avanço.

A epístola aos Romanos é mais importante obra do apóstolo Paulo, estudada por leigos, seminaristas e graduados. Apenas os mais gabaritados teólogos se aventuram em realizar estudos exaustivos e profundos na epistola aos Romanos. Quanto ao contexto histórico uma grande pergunta é quem foi o fundador da igreja de Roma. Existem muitas teorias uma das que acredito ser mais coerente é que a igreja de Roma foi fundada por judeus convertidos em Jerusalém no dia de pentecostes. Judeus que estavam na festa, se converteram ao presenciar os acontecimentos narrados em Atos capítulo 2 e, ao retornarem para suas casas, convertidos, iniciaram a igreja. Se esta teoria estiver certa, teremos a mais importante obra de Paulo, alvo de estudo de grandes teólogos (como Martinho Lutero), mas que no passado foi escrita para uma igreja de leigos em Roma.

Não podemos determinar se alguém é mais (ou menos) importante para a obra de Deus, se entre leigos, seminaristas ou teólogos qual deles é o mais adequado. Com tudo cada um tem sua função e valor, como Paulo nos ensina somos todos membros do corpo de Cristo. Talvez a melhor solução para esta disputa seja aprender que cada um tem o seu valor, Cristo morreu na cruz por todos e cada um deve fazer o seu melhor do modo mais sincero e humilde possível. Sem jamais se considerar maior ou melhor que outro.

Portanto, aceitem-se uns aos outros, da mesma forma como Cristo os aceitou, a fim de que vocês glorifiquem a Deus.”

Romanos 15:7